Todos os projetos de lei monitorados até o momento podem ser encontrados aqui.

Durante o mês de agosto de 2023, o sistema de monitoramento de Projetos de Lei do Instituto de Estudos da Religião (ISER) detectou 193 Projetos de Lei (PLs), que foram considerados de particular interesse para a organização, pois podem desencadear conflitos, disputas e construir narrativas sobre questões que tangenciam valores, comunidades ou entidades religiosas. Já foram disponibilizadas outras análises resultantes do monitoramento da Câmara dos deputados em 2023.

A equipe de pesquisa estabeleceu, inicialmente, 15 categorias analíticas com o objetivo de classificar e examinar os PLs que passaram pela Câmara.  A categorização é trabalhada mais detalhadamente no artigo de Lívia Reis, que tem como  foco os primeiros cem dias da 57ª legislatura. Como parte da metodologia em constante aprimoramento, não foi descartada a possibilidade de surgimento de novas classificações. Por exemplo, inicialmente a categoria Direitos Humanos englobava também os PLs que pautavam o debate de raça, que posteriormente se desdobrou em uma categoria analítica à parte. É importante explicitar que também existe a possibilidade de reavaliação de projetos antigos, que podem ser categorizados e incluídos em classificações já estabelecidas anteriormente.

Atualmente as 16 categorias centrais definidas a partir dos dados levantados são: 1) Direitos da Mulher; 2) Crimes e Segurança Pública; 3) Causa animal; 4) Ameaça ao Estado Democrático de Direito; 5) Imigração; 6) Educação; 7) Política de drogas; 8) Direitos da Criança e do Adolescente; 9) Regulação de mídias; 10) Família; 11) Direitos dos povos indígenas e comunidades tradicionais; 12) Direitos Humanos; 13) Calendários oficiais, patrimonialização e homenagens; 14) Religião; 15) Direitos Sexuais e Reprodutivos; e 16) Raça e Racismo.

Com base nessas categorias, são apresentados a seguir uma articulação dos temas que se destacaram no monitoramento dos PLs apresentados em agosto.  

Religião: um destaque

Tema prioritário nas pesquisas do ISER, “Religião” foi identificada no monitoramento dos PLs em agosto de 2023, como um objeto na formulação de leis da parte de parlamentares que se identificam com a confissão religiosa cristã.

O PL 3803/2023 de autoria do deputado evangélico Jeferson Rodrigues (Republicanos/GO) visa  alterar o artigo 208 do Código Penal, para acrescentar as penas dos crimes contra o sentimento religioso.  No teor do projeto é reconhecido que “a prática de ato de intolerância religiosa constitui violação ao Estado Democrático de Direito, que não se coaduna com a finalidade de construção de uma sociedade livre, justa e solidária” . O texto afirma que o PL “contribuirá para uma sociedade onde os direitos religiosos serão preservados”.

O PL 4066/2023, de autoria do deputado cristão Sargento Gonçalves (PL/RN), tem como objetivo instituir a Semana Nacional da Cultura Evangélica, a ser celebrada anualmente na segunda semana de dezembro. O objetivo é promover a integração entre instituições religiosas evangélicas, eventos culturais e a valorização da diversidade religiosa em todo o território nacional.

O deputado evangélico Hélio Lopes (PL/RJ) é autor de dois projetos de lei que merecem destaque: o PL 4110/2023  que tipifica atos de intolerância religiosa de depredação e de manifestação com intuito de zombar, debochar ou protestar em frente a templos religiosos de natureza cristã. Também, o PL 4112/2023, que tipifica atos de intolerância religiosa direcionados aos profetas e líderes religiosos cristãos. Ambos mencionam nas ementas a proteção e a liberdade de crença e de culto.

Olival Marques (MDB/PA) também é um deputado evangélico que apresentou dois projetos que pautaram religião no mês de agosto, o  PL 3790/2023, que acrescenta o inciso X no art. 1º da Lei nº 8.072, de 25 de julho de 1990. A proposta insere no rol de crimes hediondos os crimes de lesão corporal e homicídio praticados em Igrejas, Templos de qualquer Culto, e estabelecimentos religiosos. Já  o PL 3826/2023 que institui a Lei de Apoio a Organizações de Caridade Religiosas.

A Comissão de Comunicação, por meio do PDL 248/2023 aprova o ato que outorga permissão à Fundação Cultural Francisco e Clara de Assis para executar serviço de radiodifusão sonora em frequência modulada, com fins exclusivamente educativos, no Município Nova Venécia, Estado do Espírito Santo. 

O PL 3774/2023, de autoria do deputado evangélico assembleiano Raimundo Santos (PSD/PA), que está classificado na categoria  Calendários oficiais, patrimonialização e homenagens deste monitoramento do Iser, reconhece como Manifestação da Cultura Nacional, nos termos do art. 215, § 1º da Constituição Federal, a “Encenação da chegada dos missionários suecos Daniel Berg e Gunnar Vingren” no dia 19 de novembro de 1910 a Belém, no Estado do Pará, para fundarem a Assembleia de Deus, considerada a Igreja-mãe do movimento pentecostal brasileiro. 

Disputas em torno da pauta LGBTQIAPN+

Agosto é o mês da Visibilidade Lésbica.  Daiana Santos (PCdoB / RS), uma deputada afrorreligiosa, que se apresenta como “negra e sapatão” é autora do PL 4155/2023  que dispõe sobre a instituição do Protocolo Nacional de Acolhimento e atendimento à Mulher Lésbica, vítima de violência física, sexual e/ou psicológica. 

Já o PL 4224/2023 de autoria da deputada Erika Hilton (PSOL/SP), de identidade religiosa não determinada altera a Lei n° 9.263, de 12 de janeiro de 1996, para garantir aos casais homoafetivos e às famílias monoparentais o direito ao planejamento familiar.  O projeto prevê que isto ocorra, por meio de procedimentos de atenção à Reprodução Humana Assistida, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), e dá outras providências.

A pauta LGBTQIAPN+ aparece também no PL 3813/2023  de autoria do deputado cristão Maurício do Vôlei (PL/MG).  O projeto dispõe sobre a proibição do uso de imagem de crianças e adolescentes em comerciais e propagandas de manifestações LGBTQIAPN+. Por conta de seus posicionamentos homofóbicos nas mídias sociais, o jogador foi demitido de um time de vôlei em 2021 e eleito  deputado federal no ano seguinte com 83.396 mil votos.

O protagonismo nas proposições em torno de crimes e segurança pública

O tema dos crimes e da segurança pública segue sendo protagonista nas proposições legislativas. O monitoramento de PLs do ISER destaca a questão da regulação do uso de armamentos, e oferece um artigo que analisa  a batalha regulatória das armas de fogo a partir dos projetos apresentados durante o primeiro semestre de 2023  na Câmara dos Deputados . 

Vale destacar o PL 3676/2023, de autoria do deputado evangélico José Medeiros (PL/MT). O texto altera a Lei nº 13.260, de 16 de março de 2016, para classificar o porte ostensivo e ilegal e o disparo de arma de fogo de uso proibido ou restrito como atos de terrorismo.

Dois projetos apresentados no mês de agosto de 2023 são de autoria de militares que estão deputados, de identidade religiosa não identificada : o PL 3814/2023 de autoria de  Delegado da Cunha (PP/SP), que altera a Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003, para assegurar o direito ao porte, acautelamento e uso de arma de fogo a aposentados dos órgãos de segurança pública. Também o PL 3809/2023 de autoria do Cabo Gilberto Silva (PL/PB) que altera o Decreto-Lei nº 2.848, de 07 de dezembro de 1940 – Código Penal, para majorar a pena de roubo quando cometido com simulacro de arma de fogo que com estas possam se confundir. O texto do Cabo Gilberto Silva afirma que hoje os criminosos já sabem que a utilização de “armas de brinquedo” é conduta atípica, o que lhes confere a segurança de receberem uma pena muito menor se eventualmente forem apanhados pela polícia. O PL destaca:  “é imprescindível equiparar o tratamento dos crimes cometidos com simulacros de armas de fogo aos dos crimes efetivamente praticados com armas. Em ambos os casos o temor experimentado pela vítima é real. Ademais os simulacros atuais são tão perfeitas que só sendo um especialista a vítima teria como reconhecer não se tratar de uma arma de fogo real. “ 

O monitoramento do ISER identificou também que temas relacionados à tecnologia digital têm sido objeto de PLs voltados para enfrentamento de crimes e segurança pública. Um deles é o PL 3800/2023 de autoria do deputado católico Acácio Favacho (MDB/AP). A proposta altera o art. 171 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, para aumentar a pena do crime de fraude eletrônica quando a conduta for praticada com a utilização de inteligência artificial. Um dos trechos do PL diz: “Atualmente, os criminosos empregam a inteligência artificial para criar deepfakes – imagens, vídeos ou áudios falsos que parecem autênticos”. Esse tipo de material favorece a disseminação de desinformação, pois simulam ações, imagens e áudios de uma pessoa que não é a verdadeira autora. 

O uso de tecnologias digitais para auxiliar no combate ao crime tem ganhado destaque em nosso monitoramento. O PL 3750/2023  de autoria do pastor Silas Câmara (REPUBLICANOS/ AM) determina que os fornecedores de mapas para dispositivos de sistemas de posicionamento global (GPS) ofereçam funcionalidade de alerta visual e sonoro ao usuário em caso de aproximação de áreas com elevado índice de criminalidade. As possíveis implicações de um projeto de lei como este podem ser encontradas no trabalho da socióloga Iris Rosa, em que uma cartografia social da violência  é analisada a partir do aplicativo OTT- RJ (Onde tem Tiroteio- RJ). O PL 3899/2023,  de autoria do deputado cristão Sargento Portugal (PODEMOS/RJ), dispõe sobre a instituição da garantia de autonomia para ativar ou não dispositivos corporais e institucionais de áudio e vídeo, utilizados para gravações de ocorrências pelos agentes de segurança pública, elencados no artigo 144 da Constituição Federal e dá outras providências.

No agrupamento temático “Crimes e segurança pública”, do monitoramento do ISER, em agosto de 2023, aparecem PLs nos quais os animais são sujeitos de direitos, com grande destaque. Chama a atenção o Projeto de Decreto Legislativo 277/2023, de autoria do deputado cristão Daniel Freitas (PL/SC), que susta os efeitos do Decreto n° 11.615  de 21 de julho de 2023, que estipula que a caça excepcional para controle de fauna invasora só será permitida sob autorização do Comando do Exército. Tal projeto vai na direção oposta do observado na categoria ‘causa animal’ desde então, considerando na sua justificativa que o javali é um animal a ser caçado, por conta dos danos causados principalmente aos agropecuaristas. 

Outros PLs neste bloco temático incluem o de número  3762/2023, de autoria do deputado católico Miguel Lombardi (PL/SP), que dispõe sobre a possibilidade de prisão ou detenção do eleitor ou candidato  que, durante o período eleitoral, pratique  crime que envolva violência contra a mulher.  

Já  PL  3909/2023 de autoria do deputado católico Paulo Alexandre Barbosa (PSDB / SP),   altera o Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), para dispor sobre o crime de abandono de passageiro incapaz, e dá outras providências. Na justificativa, o PL cita o caso “do abandono de uma jovem mulher, de apenas 22 anos de idade, deixada inconsciente, de madrugada, na porta de sua casa, pelo motorista de aplicativo que a transportava, em Belo Horizonte, Minas Gerais. Como resultado do abandono, a jovem, totalmente vulnerável, ainda sofreu gravíssima violência sexual.” Relembre o caso aqui.

“O direito de propriedade; porém, no Brasil, tal direito nunca foi plenamente respeitado, uma vez que grupos de invasores espalhados pelo país insistem em promover invasões e destruição de propriedade privada”. A citação anterior é parte do teor do PL 4040/2023 de autoria do deputado de identidade religiosa não identificada Cabo Gilberto Silva (PL/PB) que altera o Código Penal – Decreto-lei n° 2.848/1940, para aumentar Pena dos crimes de violação de domicílio.  O deputado também é autor do  PL 3883/2023 que acrescenta o art. 299-A ao Decreto-Lei nº 2.848, de 07 de dezembro de 1940 (Código Penal), para criminalizar a conduta de obter benefício econômico mediante falsa titulação acadêmica. O foco principal desse projeto, segundo sua justificativa, é de punir os agentes públicos que se utilizam de diplomas falsos ou insinuam titulações que não possuem, seja para ocupar cargos ou para apresentar-se como alguém de uma área à qual não possui.  

Pauta do STF sobre descriminalização de drogas instiga PLs reativos

A política de drogas também teve centralidade temática na Câmara dos Deputados, durante o mês de agosto de 2023. O Supremo Tribunal Federal (STF) interrompeu, no dia 25, o julgamento que vai decidir, de uma só vez se o porte de maconha para uso pessoal é crime – o placar até a data do fechamento deste boletim, é de cinco votos a um,  para que isto não seja crime. Para o caso de ser possível diferenciar o usuário do traficante,  com base na quantidade de droga encontrada, o placar é de seis votos a zero, e já há maioria para definir uma quantidade-limite. Três proposições merecem destaque durante esse mês:

Uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), para ser apresentada, deve ser assinada por pelo menos um terço dos deputados federais (171 deputados) ou senadores (27 senadores), ou então pelo Presidente da República.  Em agosto de 2023, foi apresentada a  PEC 34/2023, que inclui dispositivos nos artigos 3º e 5º da Constituição, que estabelece o combate às drogas ilícitas como princípio fundamental e veda expressamente a descriminalização do tráfico e a legalização de novas drogas recreativas. Todos os signatários podem ser encontrados aqui

O PL 4145/2023 de autoria do deputado anglicano Kim Kataguiri (União-SP) institui normas gerais de combate ao tráfico de drogas nos centros urbanos com notório fluxo de usuários de drogas. O PL estabelece diretrizes para as forças de segurança que atuam no local, define crimes e dá outras providências.

O PL 3913/2023  é de autoria de três deputados filiados ao Partido Liberal: José Medeiros (MT) é evangélico, Mário Frias (SP) é cristão e Luiz Philippe de Orleans e Bragança (SP) de religião não identificada. O projeto visa altera as Leis nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990; nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 e nº 11.096, de 13 de janeiro de 2005, para determinar a realização de exame toxicológico para ingresso e permanência em cargos públicos; para ingresso em instituições públicas de ensino superior ou profissional; e para manutenção de bolsa de estudo paga pelo Administração Pública.

Uma intensificação de reações por parte dos parlamentares também é esperada no mês de setembro, quando o STF irá julgar a descriminalização do aborto até a 12ª semana de gestação. Este projeto de monitoramento estará atento às movimentações acerca do tema. 

Educação em saúde e sexualidade

A educação sexual nas escolas e a chamada “ideologia de gênero” sempre acionam o campo conservador. O PL 204/2023,  de autoria coletiva de parlamentares de maioria confessional cristã, susta parte dos efeitos do Decreto nº 6.286, de 5 de dezembro de 2007, que institui o Programa Saúde na Escola (PSE), e dá outras providências. O PSE visa à promoção de “saúde sexual e saúde reprodutiva”,  uma importante pauta moral de destaque nas pesquisas do ISER. A crítica em seu inteiro teor diz que “a abordagem científica acerca da análise biológica reprodutiva já integra o conteúdo programático escolar.” Justifica que o que se pretende inserir com o programa é uma “abordagem ideológica em conteúdos de ensino educacional extrapola o dever funcional do Estado.” Também diz que “o direito à vida é o maior bem jurídico garantido pela Constituição Federal” e que  “este movimento pretendeu inserir o crime ‘aborto’ como ‘direito reprodutivo’”.  

Vale destacar também o PL 4005/2023, de autoria do deputado evangélico Jeferson Rodrigues (Republicanos/GO), que dispõe sobre a obrigatoriedade de realização de palestras educativas sobre os efeitos do aborto nas escolas públicas de ensino fundamental e médio. O deputado afirma que “este projeto de lei surge como um compromisso firme com a preservação da vida”. Apesar da ênfase conservadora do autor em relação ao tema, chama a atenção, na justificativa, a apresentação de dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) referentes ao aborto seguro e à necessária conscientização das mulheres.

Sexualidade nas escolas também é tema do PL 4235/2023,  de autoria do deputado católico Prof. Paulo Fernando (Republicanos-DF). Ele altera a Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, que instituiu o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), para vedar a veiculação de imagens eróticas, pornográficas e obscenas no material escolar a ser utilizado nas escolas da educação básica. O deputado cristão Gustavo Gayer (PL/GO), que já apareceu no monitoramento do ISER  como autor do PL que  protege a fé dos professores,  é autor do PL 4259/2023  que institui o Dia Nacional de Conscientização sobre a Doutrinação nas Escolas (este tema também remete ao grupo de PLs em calendário oficiais).

Outros PLs direcionados à proteção da sexualidade de crianças e adolescentes estão relacionados às mídias. O PL 4102 /2023 de autoria do deputado de identidade religiosa não identificada  Amom Mandel  (CIDADANIA/AM) dispõe sobre a proibição da veiculação de conteúdo sexual ou adulto nas plataformas digitais que possa expor crianças e adolescentes à sexualização precoce, e dá outras providências.   

O PL 3666/2023 de autoria do deputado evangélico Capitão Alberto Neto (PL/AM) obriga provedores de aplicações a impedir o acesso a conteúdos impróprios na internet por crianças e adolescentes, por meio de filtros ou outros mecanismos.

Um outro bloco de PLs enfatizam políticas relacionadas a profissionais de educação e de saúde. Como exemplo, o PL 4212/2023, altera a Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002, que institui o Código Civil, para dispor sobre a obrigação de Estados, Municípios e Distrito Federal indenizarem em dobro os profissionais de saúde e da educação, nos casos de agressão sofrida no exercício da sua função.  Na justificativa, o PL afirma que “ameaças, injúrias, agressões e depredação do patrimônio são rotina recorrente aos profissionais que lidam com a saúde e educação na rede pública do país”. Registra também que “segundo a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) o Brasil lidera o ranking de agressões contra professores”. 

Já o  PL 4236/2023, de autoria da deputada cristã enfermeira Ana Paula (PDT/CE), altera o Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940, para agravar pena por crime de lesão corporal praticado contra profissionais de enfermagem. A enfermeira também é autora do PL 4237/2023, que altera o Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940, para agravar pena por crime de ameaça quando praticado contra profissionais de enfermagem e dá outras providências.

Caso Larissa Manoela repercute em projetos

Como já constatado no monitoramento, casos de grande repercussão pública e engajamento nas mídias sociais são refletidos diretamente na Câmara dos Deputados na forma de discursos em plenário e de PLs. Em reportagem ao Fantástico,  foi divulgado que a atriz Larissa Manoela rompeu com os pais e abriu mão de um patrimônio de 18 milhões de Reais. Os debates acerca da gestão do patrimônio de  crianças e  adolescentes e relações abusivas entre pais e filhos foram pauta de sete projetos de lei.

O PL 4053/2023, de autoria de deputados do Cidadania Alex Manente (SP),  Any Ortiz (RS),  Amom Mandel (identidade religiosa não identificada, AM),  altera a Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990 – Estatuto da Criança e do Adolescente, para dispor sobre a gestão do patrimônio e a transparência no usufruto e na administração dos bens dos filhos menores.

O PL 3997/2023 , de autoria do deputado católico Domingos Neto (PSD/CE), que altera a Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 – Código Civil, e a Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 – Estatuto da Criança e do Adolescente, a fim de promover a preservação patrimonial de crianças e adolescentes.

O PL 3929/2023 , de autoria da deputada de identidade religiosa não identificada Duda Ramos (MDB/RR), que altera o Estatuto da Criança e do Adolescente, para dispor sobre a proteção deste grupo em casos de conduta abusiva na gestão patrimonial, financeira e econômica dos recursos advindos de sua carreira artística ou esportiva.

O PL 3916/2023  de autoria do deputado católico Ricardo Ayres (Republicanos/TO) que estabelece diretrizes para a proteção patrimonial de crianças e adolescentes que desenvolvam trabalho cultural, artístico ou esportivo.

O PL 3914/2023, de autoria da deputada cristã Silvye Alves (Uniâo/GO) que acrescenta o artigo 244-C à Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, que dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente, para instituir o crime de violência patrimonial contra a criança e o adolescente.

O PL 3918/2023, de autoria do deputado cristão Ruy Carneiro (Podemos/PB) Dispõe e regula ganhos financeiros de crianças que trabalham com audiovisual, artistas mirins, para a proteção do patrimônio e investimentos futuros.

O PL 4011/2023 , de autoria do deputado evangélico Jeferson Rodrigues (Republicanos/GO), tem como objetivo primordial “zelar pela segurança e integridade das pessoas que sofrem perseguição, agressão e violência psicológica, especificamente dos seus pais ou responsáveis.”  

Direitos dos povos indígenas e comunidades tradicionais

Desde que promulgada, há 35 anos, a Constituição brasileira foi traduzida pela primeira vez para uma língua indígena: o nheengatu. Patrocinada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a nova versão da Carta Magna foi lançada em julho de 2023.  O PL 3941/2023, de autoria de Sidney Leite (PSD-AM) prevê que não só a Constituição Federal, mas também, as Constituições dos Estados, a Lei Orgânica do Distrito Federal e as Leis Orgânicas dos Município sejam traduzidas para cada língua materna dos grupos indígenas brasileiros. 

O PL 4014/2023, de autoria de Célia Xakriabá (PSOL/MG), que pratica espiritualidade indígena, também pauta o tema dispondo sobre a presença obrigatória de Intérprete/Tradutor de Língua Indígena em Órgãos Públicos, Instituições de Funções Essenciais à Justiça e Concessionárias de Serviços Públicos.

Nas últimas eleições cinco indígenas foram eleitos para a Câmara Municipal. A “bancada do cocar” tem atuado em prol dos direitos dos povos indígenas, com a apresentação de muitos projetos que merecem destaque. O  PL 3839/2023, também de autoria de Célia Xakriabá,  assegura aos povos indígenas e demais povos tradicionais o direito de usar fotografia de identificação nos documentos nacionais oficiais, com elementos que expressem pertencimento a uma comunidade ou tradição cultural. São relacionados o cocar indígena e o turbante dos povos de matriz africana, desde que esses elementos não impeçam o reconhecimento da fisionomia da pessoa.  Assim, esse projeto altera leis como o Código de Trânsito Brasileiro (1997) e a Consolidação das Leis do Trabalho (1943). 

Calendários oficiais, patrimonialização e homenagens 

Em agosto, foram identificados diversos projetos que buscam instituir datas comemorativas e homenagens voltadas a militares e profissionais de segurança pública, o que sugere uma tentativa de militarização da cultura, história e política nacionais.  Tal prática, além de sobrecarregar o calendário oficial com efemérides que, muitas vezes, não têm relevância histórica ampla, pode oferecer uma percepção pública distorcida sobre o papel das Forças Armadas e de segurança pública no desenvolvimento do país. O alto volume  de propostas legislativas para homenageá-las reforça uma imagem arquetípica de “heróis da Pátria” em detrimento das  questões críticas que envolvem o segmento, como os abusos de poder. Desta forma, o Congresso Nacional silencia sobre a complexidade da história passada e presente dessas instituições, bem como sobre os privilégios anti-democráticos que lhes são concedidos.

O deputado de identidade religiosa não identificada Cabo Gilberto Silva (PL/PB), é autor de dois projetos: o PL 4204/2023 que institui a Semana Nacional de Segurança Pública em território brasileiro, e o PL 4257/2023 que cria a semana Nacional em homenagem aos Profissionais de Segurança Pública que foram mortos no exercício da função.

O PL 4017/2023, de autoria do deputado católico Alberto Fraga (PL/DF), cria o Dia e a Semana Nacional da Segurança Pública Cidadã, e dá outras providências. O PL 3885/2023, de autoria do deputado católico Dr. Zacharias Calil (União/GO), institui o Dia Nacional do Policial Penal. O deputado cristão Nicoletti (União/RR) é autor de dois projetos que seguem a mesma pauta: o PL 3859/2023  que institui o Dia Nacional dos Veteranos das Forças Armadas, e o PL 3861/2023  que institui o Dia Nacional do Policial Rodoviário Federal e o Dia Nacional da Polícia Rodoviária Federal.

Raça e Racismo

“A falta de representatividade adequada – e, em muitos casos, a sua ausência completa – em círculos decisórios é um fator que dificulta, senão impede, mudanças na realidade extremamente desigual e injusta verificada no Brasil.” O trecho anterior faz parte do PL 4251/2023, de autoria do deputado católico Vicentinho (PT/SP), que cria a Política de Inclusão de Gênero e Étnico-Racial no âmbito da regulação bancária brasileira.  O deputado também é autor do PL 4252/2023, que altera a Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021, para estabelecer que o edital poderá exigir que percentual mínimo da mão de obra responsável pela execução do objeto da contratação seja constituído por negros e negras; assegurar margem de preferência no processo de licitação às empresas observem critérios de gênero e étnico racial.

O tema das cotas também é pautado em outros dois projetos. O PL 3891/2023, de autoria da deputada autodeclarada “sem religião” Jandira Feghali (PCdoB/RJ), que institui cota mínima para a participação de atrizes e atores, figurantes e técnicos e técnicas negros na produção de filmes, programas e peças publicitárias.

Já  PL 4002/2023 de autoria coletiva de deputados do Partido Socialista Brasileiro: Lídice da Mata (católica, BA), Jonas Donizette (cristã,SP), Felipe Carreras (confissão religiosa não identificada,PE), Lucas Ramos (católico, PE), Gervásio Maia (cristão, SP), Duarte Jr. (confissão religiosa não identificada, MA), Luciano Ducci (cristão, PR), Paulo Foletto (confissão religiosa não identificada, ES), Bandeira de Mello (confissão religiosa não identificada, RJ), Tabata Amaral (católica, PE). O texto altera a Lei nº 12.990, de 9 de junho de 2014, que reserva população negra 20% das vagas oferecidas nos concursos públicos para provimento de cargos efetivos e empregos públicos no âmbito da administração pública federal, das autarquias, das fundações públicas, das empresas públicas e das sociedades de economia mista controladas pela União, para prorrogar o prazo de vigência.

Um outro destaque na temática Raça e Racismo é o PL 3944/2023, de autoria da deputada de identidade religiosa não identificada, Érika Hilton (PSOL/SP). O projeto altera a Lei nº 12.288, de 20 de julho de 2010, para reconhecer os impactos desproporcionais da crise climática na saúde da população negra, especialmente sobre mulheres e outras pessoas em áreas mais afetadas.

Laryssa Owsiany é antropóloga, doutoranda em Ciências Sociais (PPGCS / UFRRJ) e pesquisadora no ISER.

Matheus Cavalcanti Pestana é cientista político, professor na Escola de Comunicação, Mídia e Informação da Fundação Getúlio Vargas (FGV-ECMI), doutorando em Ciência Política (IESP-UERJ) e pesquisador no ISER.