Ao focar as peculiaridades das frentes e bancadas e apontar a centralidade de parlamentares influentes, pretendemos contribuir para uma melhor compreensão das dinâmicas, das propostas e dos interesses que disputam espaço na agenda política. Sempre enfatizando suas múltiplas formas de atuação, que não são excludentes, mas complementares.

Tais articulações sempre existiram informalmente, mas passaram a ser registradas como Frentes Parlamentares a partir de 2005, mediante o Ato. nº 69/2005 da Mesa Diretora, com o objetivo de controlar os usos dos plenários e outros espaços dentro dos edifícios da Câmara dos Deputados e limitar gastos decorrentes do atendimento de demandas dos grupos articulados já existentes.

De acordo com este Ato, “considera-se Frente Parlamentar uma associação suprapartidária de pelo menos um terço de membros do Poder Legislativo Federal, destinada a promover o aprimoramento da legislação federal sobre determinado setor da sociedade”. Para serem registradas, elas devem ter a adesão de pelo menos um terço dos integrantes do Poder Legislativo federal, ser destinadas a aprimorar a legislação referente a um tema específico e ter um representante oficial. As frentes parlamentares, portanto, funcionam como formalização e cumprimento de um protocolo estabelecido pela Mesa Diretora da Câmara e são regidas por um estatuto apresentado em requerimento para a sua formação a cada legislatura. Uma Frente Parlamentar Mista é aquela que reúne deputados e senadores.

Um elemento importante para compreensão da dinâmica de formação das frentes é o fato de que parlamentares são membros de muitas delas, mesmo que não tenham ligação, ou pretendam ter, com o tema específico ou com a área de atuação temática. Isso acontece devido à imposição regimental que exige que as frentes reúnam um terço dos parlamentares. Assim, muitos deles e delas passam a integrar uma frente no momento da coleta de assinaturas porque necessitarão desse mesmo apoio quando decidirem integrar a criação de uma frente de seu interesse. No caso das frentes com identidade religiosa, e isso é muito importante de ser destacado, são vários os signatários e signatárias que não têm vínculo com a confissão religiosa tematizada, mas aderem ao grupo seja por afinidade, seja para facilitar a existência da articulação.

Já as bancadas podem ser classificadas como agrupamentos organizados de parlamentares, de caráter informal e suprapartidário, que pretendem representar os interesses de um determinado partido, de blocos partidários, de determinada região (nordestina, mineira etc) ou grupos de interesses específicos (ruralista, feminina, bala, evangélica). São diferentes das frentes porque possuem maior âmbito de atuação e agregam mais parlamentares, o que amplia a quantidade de pautas e agendas, embora os debates aconteçam em torno de um grande eixo temático. 

As bancadas são formalmente compostas por Deputados (na Câmara) e por Senadores (no Senado), agrupados de acordo com a sua representação partidária. Líderes das bancadas são eleitos entre todos os integrantes delas e falam por elas na Câmara ou no Senado. As bancadas de dois ou mais partidos, sob uma liderança comum, constituem um bloco parlamentar.

Frente Parlamentar Evangélica

A Frente Parlamentar Evangélica é a frente de caráter religioso mais antiga do Congresso. Sua primeira formação ocorreu no ano de 2004, mas a permanente e crescente articulação dela remonta ao período de distensão política pós-ditadura. Era a chamada “bancada evangélica”, existente desde 1987, no Congresso Constituinte, agregando outros parlamentares que não necessariamente possuem vínculo religioso ou pautem questões religiosas na Câmara ou no Senado.

Desde então, ajudou a alçar figuras de destaque na política brasileira como Arolde de Oliveira (DEM/RJ), Eduardo Cunha (MDB/RJ), Magno Malta (PL/ES) e Marco Feliciano (Avante/SP).

No requerimento de validação da frente na atual 56ª legislatura, a FPE obteve 203 assinaturas válidas, sendo 195 deputados federais e 8 senadores, dos quais 93 professam a fé evangélica, com o deputado Silas Câmara (REPUBLICANOS/AM) como seu presidente. 

Segundo esse requerimento apresentado ao presidente da Câmara Rodrigo Maia, em 2 de abril de 2019, a FPE reúne parlamentares “preocupados em fiscalizar os programas e as políticas governamentais, voltados à proteção da família, da vida humana e dos excluídos” e busca “participar do aperfeiçoamento da legislação brasileira do interesse da sociedade e ainda do debate de grandes temas nacionais”. Manifesta, ainda, a intenção de exercer a atuação parlamentar alinhada aos propósitos de Deus.

Frente Parlamentar Católica

A Frente Parlamentar Católica foi consolidada no Congresso em 2015, na esteira da popularidade da Frente Evangélica, e defende princípios da religião com mais adeptos do país, apesar da perda de fiéis pelo catolicismo nos últimos anos. Para atuar na presente legislatura, contou com 216 assinaturas, entre 207 deputados e 9 senadores, dos quais 140 se declaram vinculados ao catolicismo, com o deputado Francisco Jr. (PSD/GO) como presidente. 

Segundo requerimento apresentado em Assembleia Geral do Congresso de 16 de maio de 2019, a Frente Católica tem como objetivos principais “defender as doutrinas da Igreja Católica, acompanhar os projetos de lei relacionados aos princípios católicos e subsidiar deputados e senadores na elaboração e votação de projetos compactuados com as intenções da Frente”. No requerimento também consta um panorama da importância da confissão católica no Brasil, destacando uma “dívida” que a sociedade possui em relação à Igreja Católica e seu legado positivo na formação do povo brasileiro. Das três frentes analisadas na pesquisa, esta é a que mais menciona preceitos religiosos em seu requerimento, convocando, inclusive, toda a Frente a “participar, pelo menos uma vez no mês, da Santa Missa, de preferência na sede da CNBB”. 

Frente Parlamentar em defesa dos Povos Tradicionais de Matriz Africana

A Frente Parlamentar em Defesa dos Povos Tradicionais de Matriz Africana (FPMA) tem uma forma particular de mobilização quando comparada às demais frentes com identidade religiosa tratadas na pesquisa. O componente religioso é incorporado ao discurso mais amplo de reivindicação do cumprimento da Constituição de 1988 e da Declaração Universal dos Direitos Humanos, além de tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário. A agenda da FPMA se alia também ao ativismo antirracista quando incorpora em seu requerimento a finalidade de “promover o conhecimento e o valor universal dos povos tradicionais de matriz africana”, em concordância com a emblemática Conferência de Durban de 2001 (inclusive, mencionada no requerimento). 

A primeira composição desta frente data de 2011 e tinha como nome Frente Parlamentar em Defesa das Comunidades Tradicionais de Terreiros. Era presidida pela deputada federal Erika Kokay (PT-DF), tal como na formação atual. No requerimento da presente legislatura, a Frente contou com 218 assinaturas válidas, entre 214 deputados e 4 senadores. Entretanto, esse número não inclui a presidente da Frente, uma vez que o nome dela não consta na lista de signatários conforme o website da Câmara Federal, o que alteraria o número para 219 membros. Nenhum dos signatários da Frente declara pertencimento a religiões de matriz africana.

Foto: Pedro França/Agência Senado